Ciclocosmo https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br Um blog para quem ama bicicletas Thu, 02 Dec 2021 18:10:08 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 ‘Outro Rolê’ denuncia segregação cultural paulistana https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/11/21/outro-role-denuncia-segregacao-cultural-paulistana/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/11/21/outro-role-denuncia-segregacao-cultural-paulistana/#respond Sun, 21 Nov 2021 21:53:25 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/11/outroroleA-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3362 Recém lançado, o documentário “Outro Rolê” esfrega em nossa cara o quanto a bicicleta e suas capacidades de inclusão social são desprezadas pelas políticas públicas e por grande parte dos próprios paulistanos —usar a bicicleta para deslocamentos em São Paulo ainda é condição de inferioridade, perigo, medo e preconceito, quando já deveria ser o contrário!

O filme começa revelando o cenário caótico da cidade —uma vista aérea mostra a trama de cimento e asfalto dominada pelo ruído do trânsito: motores, buzinas e sirenes. Nos instantes seguintes é apresentada uma sequência de ação; são planos curtos e sobrepostos de ciclistas se aventurando pelas perigosas “trilhas” abertas entre carros, sarjetas, buracos e postes. A cena, onde o ciclista urbano é protagonista, parece retirada da tela de um videogame que desafia os limites humanos e subverte a lei da gravidade —só que não! Neste caso, a subversão é ao Código de Trânsito Brasileiro, que prevê a bicicleta como o veículo a ser respeitado, não desafiado.

O enredo revela uma luta do ciclista urbano contra uma cidade que o ignora e o exclui. Uma horda de motoristas violentos, políticos desinteressados e um terreno hostil lembra roteiros de ficção. Mas a narrativa não é nada fabulosa nem extraordinária, é a pura realidade, nua e crua, em exibição pública e gratuita em cada esquina da cidade.

Durante todo o filme, relatos dão conta do descaso do poder público e da cegueira da sociedade para o universo da mobilidade sustentável. 

Ao apontar as lentes para a periferia, a produção mostra líderes comunitários clamando por ciclovias e oportunidades enquanto uma multidão de ciclistas suburbanos ocupa o trânsito desordenado que liga pobres guetos aos arranha-céus do centro financeiro nacional.

A seguir, um bate-papo com o diretor do filme, o cineasta Guilherme Valiengo:

Quem são os personagens de seu filme?

Guilherme Valiengo: Durante todo o processo desse projeto, acredito que a cidade de São Paulo se revela como um dos personagens principais do filme. Através das histórias e situações vividas ao longo do documentário, conseguimos entender um pouco do processo burocrático dentro das sub-prefeituras e também da luta dos cicloativistas em fazer com que as ciclovias saiam do papel. A cidade de São Paulo acaba sendo retratada nas regiões mais extremas, nas franjas da cidade, sem deixar de mostrar o que acontece na região central.

Por que existem muito mais carros do que bicicletas rodando em São Paulo?

Guilherme Valiengo: A cidade desde sempre foi pensada muito mais para os carros do que para as pessoas. A cultura do automóvel foi se desenvolvendo ao longo de muitos anos em todo o país. Pensar a cidade de uma maneira integrada entre todos os modais é um desafio muito grande, principalmente em São Paulo onde o crescimento desordenado acaba se impondo. O que vemos hoje é uma tentativa de arrumar a casa, uma necessidade de dividir os espaços e entender a cidade como uma rede que se conecta de todos os lados. Hoje o carro acaba sendo mais problema do que solução, a cidade não comporta mais automóveis como antigamente. As necessidades são outras e a cidade tem se transformado aos poucos para tentar trazer um ciclista a mais, um pedestre a mais, e, consequentemente, menos carros nas ruas. O aumento de estruturas cicloviárias e um transporte público eficiente são medidas que podem ajudar a diminuir o número de carros. Porém, estamos falando de uma realidade que ainda é para poucos. Essa não é a realidade de quem vive nos extremos da cidade. Quando a moradia fica distante do trabalho e a infra-estrutura não existe, cada um vai se virar do jeito que der.

O que falta para que a bicicleta seja respeitada e ganhe credibilidade em São Paulo?

Guilherme Valiengo: Acredito que seja uma combinação de vontade política, pressão popular, educação e readequação urbana. Existe uma questão que é o tamanho da indústria automobilística em todo o mundo, é muito dinheiro em jogo —carros a menos significam menos pessoas comprando carros, fazendo seguro, comprando combustível… O filme mostra um pouco o trabalho e a luta diária dos cicloativistas que batalham por uma cidade conectada e segura para todos.

O que significa a bicicleta para a periferia?

Guilherme Valiengo: Lá estão bairros onde não existem ciclovias, sistema de compartilhamento de bicicleta, ruas sinalizadas, pavimentação e opções de entretenimento. Ainda assim, a bicicleta está presente em vários aspectos. A bicicleta é uma opção de lazer que acaba suprindo a falta de equipamentos públicos para os jovens periféricos. Além do lazer, diariamente inúmeros moradores cruzam a cidade de bicicleta; são pessoas comuns que utilizam a bike com o objetivo de economizar tempo e dinheiro no final do mês.

ONDE ASSISTIR: https://planetdoc.org/a-different-spin/

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No dilema energético, bicicleta ‘a feijão’ é escolha certa https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/11/07/no-dilema-energetico-bicicleta-a-feijao-e-escolha-certa/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/11/07/no-dilema-energetico-bicicleta-a-feijao-e-escolha-certa/#respond Sun, 07 Nov 2021 14:01:53 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/11/bike_3-8-12_0052-2A-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3345 “Basta de nos matarmos com carbono. Basta de tratar a natureza como uma latrina. Basta de queimar, perfurar e minerar cada vez em maior profundidade. Estamos cavando nossa própria cova”, alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres, na abertura da COP26.

Se depender das necessidades, e do discurso de Guterres, está posto: vivemos um ponto de inflexão histórica onde o fogo não é mais a grande arma da existência humana, mas sua grande armadilha.  Os alertas estão em todo canto —da natureza às manchetes de jornais—, viver no mundo movido a combustão está cada vez mais sufocante.

Tão quentes quanto nosso temido destino, as alternativas para geração de energia começam a fervilhar. A transição energética para fontes renováveis aparece como a solução da vez. Não faltam planos para mitigar as mudanças climáticas, e a descarbonização da economia passou a ditar os contratos futuros —usinas eólicas e fotovoltaicas são agora as novas apostas de empresas que ainda chamamos de “gigantes do petróleo”. 

Pesquisa da Agência Européia do Ambiente indica que 77% das necessidades energéticas dos europeus são supridas com recursos não renováveis—petróleo, gás, carvão e nuclear. Triste comprovação para uma cultura que sempre esteve à frente de seu tempo, e que ainda mantem a liderança no total das emissões cumulativas de CO2 (desde a Revolução Industrial). Mas essa realidade já tem data para acabar. A partir de 2035, toda frota de carros daquele continente deverá ser movida a energia elétrica. Iniciativa semelhante acontece com a indústria da aviação comercial —protótipos de aviões a bateria já testam suas capacidades de sustentabilidade.

Aproveitando o embalo, a indústria da bicicleta resolveu entrar “na roda” desses veículos “limpos” e já inunda o mercado com bikes movidas a “pedal assistido”. A propaganda promete agilidade sem perder as características limpas da velha bicicleta, mas a nova opção é na realidade muito mais pesada e carrega consigo um punhado de compostos químicos de potencial risco —as baterias de íons de lítio. Assim como o calor do fogo, as armadilhas das novas opções energéticas “limpas” são perigosas e precisam ser conhecidas para impedir o surgimento de novas crises ambientais e sociais.

Para Flavio de Mirando Ribeiro, doutor em Ciências Ambientais e professor da FIA, a transição energética para os recursos renováveis também oferece riscos e se revela não tão sustentável como a propaganda promete. “Baterias que alimentam veículos elétricos são feitas de metais raros, matéria prima escassa a ser minerada em grande escala, como cobalto, manganês e alumínio. Isso causa grande impacto ambiental”, diz Ribeiro, que vai além: “os países onde estão as maiores reservas desses minerais são famosos por práticas inadequadas de trabalho ou até mesmo escravidão. É um risco social que deve ser avaliado por quem acha que veículo elétrico é garantia de sustentabilidade”.

Para o professor, apesar dos riscos, a transição energética para as fontes renováveis é vantajosa, mas há de se criar políticas públicas que regulem importantes soluções. Reciclagem e reuso de baterias devem ser normatizados para evitar um novo colapso dos recursos naturais, e a rastreabilidade da matéria prima deve garantir a origem humanitária do material minerado —mineradores devem ter seus direitos respeitados.

Preocupada com a sustentabilidade, a Specialized —indústria americana de bicicletas que vende modelos elétricos no Brasil— oferece um serviço de coleta de baterias deterioradas para o consumidor brasileiro. As peças recolhidas são enviadas para a única empresa nacional capaz de separar os diferentes metais raros presentes na bateria —os metais são então vendidos para outros usos. Apesar do processo ter o nome de reciclagem, as baterias que não são reutilizadas também não são recicladas em forma de novas baterias. Ainda não há em nosso país nenhuma indústria capaz de reciclar completamente —nem mesmo de produzir—  baterias de íon de lítio, tipo usado para alimentar veículos elétricos. 

O professor Ribeiro comenta, “sustentabilidade é um adjetivo relativo, depende de quanto cada um está disposto a mudar os próprios hábitos. Nesse caso, a bicicleta ‘movida a feijão’ [força humana] é a melhor alternativa”.

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Na contramão do bom senso https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/10/27/na-contra-mao-do-bom-senso/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/10/27/na-contra-mao-do-bom-senso/#respond Thu, 28 Oct 2021 02:15:10 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/10/2568panbrods_1-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3300 Mesmo às vésperas da 26ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (Cop 26), o Governo de São Paulo publicou duas normas que limitam o uso da bicicleta no ambiente urbano, seguindo assim na contramão das tendências mundiais de transporte sustentável —um dos temas centrais da Conferência. 

A primeira norma, publicada no último dia 15 pela Secretaria de Logística e Transportes, define, através da Portaria 122, os limites de uso da bicicleta nas estradas paulistas. 

A nova instrução legal proíbe “comboios de ciclistas” de circularem nas rodovias estaduais sem prévia autorização e pagamento de taxa. De acordo com o documento, poderão fazer uso de estradas e rodovias apenas “transeuntes que utilizam os ciclos como meio de transporte, quais sejam, deslocamento ao trabalho e trânsito comum, ou seja, aqueles alheios às atividades de desporto” —ou seja, pelotões de ciclismo de estrada, profissionais e amadores, que sustentam parte da cultura da bicicleta nesse país, vocês perderam mais uma! Como se já não bastasse a limitação de horário para ciclistas nas ruas da USP —4h às 6h30— e a ausência completa de centros de treinamento para ciclismo de estrada na capital —o velódromo da USP é uma ruína—, a cultura da bicicleta sofre agora com mais um ataque do Estado.

Já a segunda norma, publicada pelo Metrô de São Paulo e pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), reduz o horário de acesso de bicicletas às estações e aos trens. A partir da próxima segunda-feira (1/11), bicicletas não poderão mais ser transportadas nos vagões entre 10h e 16h. De acordo com a Central de Informações do Metrô, o horário de transporte de bicicletas “voltará ao normal”. Só serão aceitas bicicletas nos vagões entre 20h30 e meia-noite.

A assessoria de imprensa do Metrô diz desconhecer a nova norma de limitação de horários para bicicletas nos seus trens (mesmo após a ampla divulgação pela própria Companhia). Normal…

Questionado por telefone sobre a Portaria 122, o governador João Doria disse que estava em viagem ao exterior —o governador visita feira em Dubai (Emirados Árabes Unidos)— e preferiu delegar a resposta à Secretaria de Comunicação. Por meio de nota, o governo informou que “cumpre a legislação vigente no país e no estado de São Paulo, em especial o CTB [Código de Trânsito Brasileiro]”.

Para Daniel Guth, diretor do Aliança Bike (Associação Brasileira do Setor de Bicicletas), “o texto da Portaria 122 não é claro e está sujeito a interpretações diversas”. Guth indica ainda que “a Portaria trata de regra que entra em conflito com o CTB”, e ressalta que o Aliança Bike já entrou com pedido no DER (Departamento de Estradas e Rodagem) e no Ministério Público Estadual para suspensão dos efeitos da nova norma.

O mais incrível é que a feira que Doria visita em Dubai trata de clima, oportunidades, sustentabilidade e mobilidade —ou seja, os grandes valores da bicicleta para um mundo que clama por melhores condições de saúde e transporte. Além disso, estamos a três dias da inauguração da Cop 26, a conferência da ONU que tem como grande ambição atualizar os compromissos ambientais assumidos pelo Acordo de Paris (2015).

O que mais precisa ser dito para convencer a administração pública que sua direção está na contramão dos caminhos sustentáveis, que são os veículos automotores que precisam ser restringidos, não as bicicletas? Como já foi dito aqui, para conter a poluição do ar, países desenvolvidos estão trocando os carros pela bicicleta já faz um certo tempo.

O ciclismo —como esporte, lazer ou transporte— tem função primordial na modificação dos costumes de uma sociedade que cada vez mais morre sufocada pela fumaça —segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), a poluição do ar está entre as 10 principais causas de morte no Brasil.

Governos que não se adequarem às questões climáticas, que não incentivarem o acesso universal ao transporte sustentável e aos novos costumes de preservação ambiental, são como carros movidos a gasolina —vilões do presente, lixo do futuro.

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Na semana da mobilidade, São Paulo pôde festejar, mas há muito a mudar https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/09/26/na-semana-da-mobilidade-sao-paulo-pode-festejar-mas-ha-muito-a-mudar/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/09/26/na-semana-da-mobilidade-sao-paulo-pode-festejar-mas-ha-muito-a-mudar/#respond Sun, 26 Sep 2021 16:55:57 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/GGG4455-2-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3197 “Atualmente, São Paulo virou referência de estrutura cicloviária”, contudo, “ainda temos vergonha de suar, de chegar de bicicleta nos lugares.” Juntos, esses dois comentários —respectivamente do urbanista Gustavo Partezani e da vereadora e cicloativista Renata Falzoni— demonstram o nível da dicotomia cultural que a mobilidade sustentável sofre na cidade mais populosa do Ocidente.

Com a maior malha cicloviária do país —segundo a CET, são 684Km—, a cidade de São Paulo ainda não preparou seus cidadãos para utilizá-la. Para Partezani, ainda falta um plano de educação para a mobilidade: “a urbanidade ensinada nas escolas ainda não aborda uma questão fundamental no desenvolvimento do ser-humano, que é a educação para o espaço público, para a mobilidade.” 

Durante a semana mundial da mobilidade (20-26 de setembro), percorri —de bike, claro— ruas do centro e da periferia da cidade. O que senti foi chocante, e confirma a falta de pedagogia para a mobilidade, relatada por Partezani. A já famosa agressividade do motorista brasileiro, sentida na pele por todo ciclista que roda por aqui, surge —ridícula e obviamente!— de uma falta de investimento em educação para os deslocamentos urbanos sustentáveis. A formação básica dos cidadãos para o tema da mobilidade, seja qual for seu estrato social, é superficial ou inexistente dentro do sistema educacional de nosso país.

Ciclistas na ciclovia da av. Paulista (foto: Caio Guatelli/Folhapress)

Desde o Tremembé (zona norte) até o Capão Redondo (zona sul), passando pelo caos do centro, pelo rico Jardins e pelo diverso Paraíso, o cenário falho é todo muito parecido —com as portas voltadas para importantes ciclovias, escolas paulistanas tem nenhuma (ou quase nenhuma) preocupação com cidadãos ciclistas. Falta desde a oferta de estrutura para estacionar bicicletas, até a importante orientação pedagógica sobre o assunto.

A vereadora Falzoni indica que, no Brasil, aprendemos a nos deslocar na cidade por conta própria: “somos orientados pelo ‘não!’ —‘não pedale na rua!’—, mesmo a rua sendo legalmente uma via para bicicletas.” A vereadora ainda comenta que na Alemanha, a educação para a mobilidade sustentável começa muito cedo: “lá as crianças aprendem a pedalar na escola, aos 6 anos de idade. Quando chegam aos 12, passam a ensinar as mais novas e ganham o diploma de cidadã.”

De volta à realidade nacional… Os dois filhos adolescentes da engenheira Erika Horta estudam no Bandeirantes, uma das escolas que mais produzem intelectuais em São Paulo. Mesmo morando no bairro do “Band” (Paraíso), Erika prefere levar os filhos de carro ou a pé por temer o trânsito agressivo. Sobre a orientação escolar, a mãe comenta: “acho que a escola não os encoraja, lá não há nem bicicletário”. 

Entregador usa bicicleta na ciclovia da av. Paulista (foto: Caio Guatelli/Folhapress)

Questionado, o Bandeirantes afirmou ter oferecido, em 2019, um programa extra-curricular sobre mobilidade urbana para a primeira série do ensino médio. Entretanto, a direção da instituição não comentou sobre a continuidade do curso, nem soube responder sobre as qualidades dos próprios equipamentos de apoio ao deslocamento por bicicleta. Disseram haver um bicicletário, mas não respondem sobre o número de vagas e a frequência de sua utilização. Levantei o dado por conta própria —são apenas 6 paraciclos para 2600 alunos!

Muitos alunos do Bandeirantes nunca ouviram falar da oferta do programa extra-curricular citado pela direção da escola, tampouco da existência dos paraciclos.

Na região central, alunos e professores da escola municipal Celso Leite Ribeiro Filho são servidos com uma ótima ciclovia que passa pelo portão de entrada. De nada adianta —na escola não há sequer uma única vaga para bike. “Nunca vi ninguém chegar aqui de bicicleta. Nem professor, nem aluno, nem pai de aluno”, relatou um dos professores da instituição enquanto uma van escolar atendia seis estudantes, moradores do mesmo bairro onde fica a escola.

Chega a ser constrangedor —tantos investimentos públicos e privados em malha cicloviária, tantos alertas sociais e ambientais, e tanta gente insistindo no trânsito sujo e caótico que nos adoece e mata desde o século passado! Sem falar no custo do carro, dos 7 Reais por litro de gasolina, do tempo perdido… A mudança de hábitos é urgente, e começa com incentivo e educação —para jovens e adultos— em ocupação sustentável e pacífica do espaço público.

Pela ciclovia do Rio Pinheiros é possível ir de Pinheiros até Interlagos pedalando. De quebra, você pode conhecer muita gente legal pelo caminho! (foto: Caio Guatelli/Folhapress)

Guardadas as excessões —e com todo o respeito a quem não pode pedalar—, carro é, na maioria das situações urbanas, um atraso em sua vida! Bora chegar de bike na escola, no trabalho, na casa dos amigos… Além de cuidar da sua saúde, você conhecerá gente muito mais interessante pelo caminho do que conheceria trancado em sua bolha ambulante —experiência própria, pode confiar!

SERVIÇO

Rede Bike Anjo —O projeto tem por objetivo trazer mais ciclistas para as ruas, de forma segura. A rede oferece aulas GRATUITAS para quem quer aprender a pedalar ou para quem já sabe mas tem medo de se deslocar pela cidade. Os voluntários —bike anjas e bike anjos— também oferecem soluções para colégios e empresas.

Para chama-los, basta se inscrever (por aqui).

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Mostra sobre a bicicleta na Europa escancara o atraso brasileiro https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/09/15/mostra-sobre-a-bicicleta-na-europa-escancara-o-atraso-brasileiro/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/09/15/mostra-sobre-a-bicicleta-na-europa-escancara-o-atraso-brasileiro/#respond Wed, 15 Sep 2021 22:46:08 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/1921-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3164 A arriscada aventura de pedalar nas cidades brasileiras não é nenhuma novidade. Por repetidas vezes, aqui neste Ciclocosmo, a jornalista Erika Sallum nos alertou da dura realidade vivida no Brasil por quem escolhe se locomover de bicicleta. No último Dia Internacional da Mulher, Erika escreveu: “por aqui, vemos cada vez mais mulheres vencendo seus medos para praticar um ato de coragem absurda: pedalar neste país machista, violento e onde governantes e motoristas ainda relutam em admitir o poder que tem a bike de mudar vidas e nações inteiras”. 

É impressionante o tamanho do prejuízo social causado pelas atuais políticas públicas que cercam o universo da bicicleta neste país. As origens desse drama, em sua maioria, estão na cultura retrógrada que prioriza a indústria do automóvel, na política nacional que insiste há anos na educação de baixa qualidade, e numa ideologia (hoje no comando) que nega os alertas sociais e ambientais.

Imagine poder sair de bicicleta todos os dias para trabalhar, estudar ou se divertir, sabendo que pelo caminho não será xingado ou ameaçado, e que suas chances de ser atropelado ou roubado serão muito pequenas. Imagine ainda mais —ganhar uma grana do governo para trocar o uso do carro pelo uso da bicicleta, ou então receber todo mês um voucher do seu patrão para gastar no que quiser dentro de sua bicicletaria preferida. Utopia? Não, isso existe! Mas claro, não é aqui.

Na França, por exemplo, o governo desenvolveu uma política de incentivo ao uso da bicicleta para o desconfinamento pandêmico —investiu 20 milhões de Euros no financiamento de reparos de bikes em desuso (leia mais aqui). No Reino Unido, o governo oferece subsídios de até 39% na compra de bikes através do programa Cyclescheme. O incentivo existe desde 1999 e é concedido para quem escolhe a bicicleta para os deslocamentos urbanos a trabalho. Na comuna de Pesaro, costa leste da Itália, o governo local decidiu dar à bicicleta o protagonismo no transporte urbano. Ruas foram estreitadas e centenas de vagas de carros foram eliminadas pelo projeto Bicipolitana.

Os resultados de políticas virtuosas como essas podem ser vistos na mostra fotográfica “Bicicleta, Identidade Cultural”, da jornalista Denise Silveira. Seu ensaio fotográfico nos traz belos exemplos de como governos e cidadãos europeus aproveitam as grandiosas capacidades da bike para tornar a vida urbana muito mais pacífica, saudável, econômica, sustentável e feliz, e escancara o atraso brasileiro em fazer da bicicleta um veículo de respeito, capaz de melhorar a vida dos cidadãos.

No espaço de um carro cabem dez bicicletas, indica o letreiro do estacionamento para bikes em Londres (Foto: Denise Silveira)

Após apreciar as obras de Denise no Unibes Cultural —24 fotografias e o curta-metragem documental “Alma de Bicicleta”—, é possível que o espectador sinta até uma inveja dessa realidade remota e tão fecunda ao compará-la com a nossa, visceral e tão mambembe. No mínimo desperta-se uma indignação em ter que encarar, novamente, a guerra latente contra o uso da bicicleta em território nacional.

Nos tantos flagras que Denise reuniu em três viagens pela Europa (realizadas em 2016, 2018 e 2019), fica evidente uma relação inata do europeu com a bicicleta, cercada por respeito e admiração. O ensaio de Denise começou despretensioso, em 2016 na Bélgica, num reencontro com velhos amigos —pais de seu falecido companheiro, o músico belga Jeroen Raedschelders, morto em 1997 em acidente automobilístico— que apresentaram à jornalista alguns redutos flamengos pouco conhecidos por turistas.

Ao fim da primeira experiência, toda clicada em celular, Denise percebeu que a maioria dos seus registros captava bicicletas no quadro fotográfico. Eram situações rotineiras, flagras de uma vida real (e encantadora). A jornalista passou então a investir no tema, e dedicou atenção especial às bicicletas nas duas viagens seguintes. A cultura ciclística foi então registrada na Alemanha, Bélgica, Irlanda, Inglaterra, Holanda e Rússia.

Funcionário da companhia aérea Lufthansa usa bike para se locomover dentro do aeroporto de Frankfurt (Foto: Denise Silveira)

Para Denise, sua experiência ficou marcada pelo padrão de respeito conferido à bicicleta por governos, indústria e cidadãos daquele continente. Ao analisar seu ensaio, a jornalista exalta a importância do espaço dedicado exclusivamente aos ciclistas na estrutura urbana, como as “corona lanes” —corredores e estacionamentos exclusivos para bikes, criados pela prefeitura de Londres para a época da pandemia.

Ao comparar a realidade européia à nossa, Denise é certeira: “falta um movimento do governo e do empresariado para cuidar do ciclista comum, daqueles que precisam usar a bike para trabalhar. Imagina uma mulher, mãe, ter que sair pedalando da periferia e atravessar uma ponte lotada de carros para alcançar seu trabalho no centro. É uma loucura fazer isso por aqui! Nossa malha cicloviária, além de limitada, é mal projetada, pouco inclusiva, machista”. 

INFORMAÇÕES

Exposição: Bicicleta, Identidade Cultural

Quando: Até 30 de setembro, com horário marcado pelo website

Onde: Unibes Cultural (ao lado da estação Sumaré do metrô)

Quanto: Gratuito

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Cicloativistas defendem grande eixo cicloviário ligando SP até Santos https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/06/17/cicloativistas-defendem-grande-eixo-cicloviario-ligando-sp-ate-santos/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/06/17/cicloativistas-defendem-grande-eixo-cicloviario-ligando-sp-ate-santos/#respond Thu, 17 Jun 2021 13:24:24 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/2-320x213.jpeg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3113 Palmas e vivas para os ótimos coletivos de ciclistas que existem em São Paulo — são eles que propõem soluções, cobram o poder público, fiscalizam o dia a dia ciclístico da cidade e, sempre incansáveis, pensam em como a capital pode melhorar sua mobilidade por meio da bicicleta.

Recentemente, os coletivos Bike Zona Sul, Bike Zona Oeste, Bike Zona Norte e Bike Zona Leste têm batalhado para que uma ideia genial finalmente seja colocada em prática por aqui: um grande eixo cicloviário intermunicipal conectando todas as zonas de São Paulo até Santos, incluindo Guarulhos numa ponta e a Rota Turística Marcia Prado na outra.

Conectar diversas regiões de cidades por meio de ciclovias é uma estratégia fenomenal que ajuda a melhorar o trânsito e a levar mais pessoas a se locomover de bike.

Em lugares como Pesaro, uma comuna na costa leste da Itália, há redes de ciclovias que interligam centro e bairros, com sinalização inteligente (o projeto ganhou o nome de Bicipolitana, sobre o qual escrevi aqui).

Veja o mapa ciclístico de Pesaro, que beleza — organizado por cores semelhantes ao metrô de Londres e repleto de oficinas mecânicas e outros comércios importantes para quem pedala ao longo dos percursos:

Em São Paulo, o grande eixo cicloviário contemplaria a ciclovia do Rio Pinheiros, que possui atualmente 21,5 km, que se ligaria a uma ciclovia do Rio Tietê, a ser construída, com 26 km. Dali, ela se comunicaria com a atual ciclovia do Parque Ecológico do Tietê (14 km) e, a partir de um novo trecho de 8 km, chegaria até o aeroporto de Guarulhos. Tudo de forma supersegura para o ciclista.

Na outra ponta do Rio Pinheiros, a ciclovia se estenderia de modo a se ligar com a Rota Cicloturística Marcia Prado até Santos. Tudo totalizaria 146 km, com a maior parte do trajeto acontecendo sem contato com carros, ônibus, motos e afins.

Com a realização do eixo cicloviário, ciclistas de muitas regiões da cidade poderiam se deslocar para Guarulhos, Santos, e vice-versa. Seria uma baita ferramenta para incentivar mais pessoas a deixarem seus carros, a cuidarem mais da saúde, fazerem esportes e, resumindo, terem uma rotina muito melhor.

“Essa ideia é antiga e já foi citada algumas vezes ao longo dos anos por cicloativistas. A diferença é que agora em 2021 analisamos mapas e vias para propor um trajeto mais detalhado”, diz Thomas Wang, 26, do Bike Zona Sul.

Wang explica que o projeto depende de estudos, de vontade política e, claro, de verba do governo do Estado, das prefeituras e diferentes autarquias e empresas envolvidas. “É uma proposta que abrange várias regiões e autoridades, por isso é complexa e precisa do apoio de todos os ciclistas e de grupos que trabalham com mobilidade, turismo e sustentabilidade.”

Nos últimos tempos, o governo e a prefeitura de São Paulo vêm demostrando maior interesse em assuntos ligados à bicicleta. Seria um passo importantíssimo se o poder público transformasse a ideia do grande eixo em realidade — melhorando a vida não só de ciclistas, mas de todo mundo que mora aqui.

 

 

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Dez anos de atropelamento de ciclistas no RS é relembrado com ato mundial https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/02/24/dez-anos-de-atropelamento-de-ciclistas-no-rs-e-relembrado-com-ato-mundial/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2021/02/24/dez-anos-de-atropelamento-de-ciclistas-no-rs-e-relembrado-com-ato-mundial/#respond Wed, 24 Feb 2021 20:23:11 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/02/WhatsApp-Image-2021-02-24-at-15.56.14-320x213.jpeg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3027 Foi uma cena surreal, que a gente não esquece nem depois de dez anos: durante uma manifestação de cicloativistas da Massa Crítica de Porto Alegre, o bancário Ricardo Neis atropelou intencionalmente 17 participantes.

Ele estava em um Golf preto e, após ficar irritado por não conseguir passar pelo protesto, decidiu que o melhor a fazer não era, por exemplo, virar em uma outra rua ou esperar uns minutos — mas, sim, dar ré, pegar “impulso” e jogar seu automóvel contra o grupo de ciclistas.

Em 2016, o motorista enfim foi condenado por 11 tentativas de homicídio e cinco acusações por lesão corporal. Porém só foi preso mesmo em maio de 2020.

O atropelamento não gerou apenas choque e revolta no país e no resto do planeta. Por causa dele, cicloativistas de diversas nações decidiram se unir para criar o Fórum Mundial da Bicicleta, um movimento horizontal com o objetivo de debater a questão da bike nas cidades e encontrar caminhos para melhorar a mobilidade e fazer com que os centros urbanos planejem com mais consciência seu espaço para pedestres e ciclistas.

No dia 25 de fevereiro (nesta quinta-feira), completa-se uma década do trágico ataque de Ricardo Neis contra essa comunidade de bikers que estava reunida exatamente para se fazer vista e ouvida pelas autoridades e cidadãos — isso em uma época bem menos bike friendly do que hoje.

Ciclistas ao lado das bikes atropeladas por um motorista em Porto Alegre, em 2011 (Foto: Agência Folha/Veja)

Para celebrar a data — e relembrar a violência que ainda existe contra quem pedala, o Fórum Mundial da Bicicleta está conclamando ciclistas a participarem de um ato coletivo contra a violência no trânsito.

Em tempos de pandemia, o protesto do dia 25 pode acontecer de diversas maneiras, mesmo que seja postar uma foto em sua rede social pedindo mais responsabilidade de motoristas e governo, ao lado da hashtag #movendomassas (se puder colocar as versões em inglês e espanhol, ajuda: #movingmasses e #moviendomasas).

Vale também reunir amigos (todos de máscara, evidentemente) e pedalar em sua cidade, em um ato pacífico de ocupação do espaço público pelo meio de locomoção mais limpo e incrível que existe: a bike.

A cicloativista colombiana Ximena Maria Rodriguez Figueroa faz parte do Fórum Mundial e também é empreendedora no mercado cada vez mais pulsante que envolve a bicicleta, como dona da marca Chic*Lista, que produz lindas mochilas e bike bags em seu país.

Ela conversou com o Ciclocosmo sobre o Fórum, os dez anos do atropelamento e sobre a importância de se celebrar essa data para que ninguém esqueça daqueles que arriscaram e arriscam a vida para fazer das cidades lugares mais amigos da bike e das pessoas em geral:

A colombiana Ximena Maria Rodriguez Figueroa, do Fórum Mundial da Bicicleta (Foto: Arquivo Pessoal)

CICLOCOSMO: Qual o papel do Fórum Mundial da Bicicleta hoje? E como você avalia estes dez anos de movimento?
XIMENA FIGUEROA: Desde sua criação, o Fórum teve um papel muito importante na construção da ideia de mobilidade sustentável através de espaços onde se possa discutir mobilidade ciclística, segurança, infraestrutura cicloviária etc. Hoje temos reconhecimento mundial, como um evento que reúne cicloativistas e expoentes da mobilidade e da luta pela cidadania.

Em 2021, estamos organizando o 10º Fórum Mundial da Bicicleta, entre 8 e 12 de setembro, em Rosário, na Argentina. É muito gratificante saber que, a cada edição, atraímos mais pessoas querendo se vincular ao Fórum, vindas de diferentes áreas e todas interessadas em gerar impactos, mudanças e evoluções no universo ciclístico em diversas cidades do planeta.

Nestes últimos dez anos, o espaço para a bicicleta foi muito discutido no mundo, e a figura do ciclista vem ganhando destaque. Por que você acredita que isso aconteceu? 
Sem dúvida, o espaço aberto pelo Fórum Mundial da Bicicleta tem sido de grande importância para dar voz ao ciclista e exigir melhores condições e infraestrutura para se pedalar nas cidades.

Somado a isso, o mundo em geral vem passando por uma transformação e conscientização em relação à sustentabilidade, ao meio ambiente. O comportamento das pessoas já não é mais o mesmo de dez anos atrás, e uma boa parte da humanidade agora está mais consciente sobre o mundo em que vive e sobre as pequenas e grandes mudanças que podem ser conseguidas em se assumir certos hábitos que beneficiam o indivíduo e o coletivo — por exemplo, priorizar a bicicleta como meio de transporte como forma de reduzir a emissão de poluentes e também de melhorar a saúde dos cidadãos.

Ainda falta muito para que as cidades respeitem o ciclista e criem condições reais de segurança para que mais pessoas usem a bicicleta. Como essa situação pode melhorar?
É lamentável ver como ainda existe rancor e até mesmo ódio pelos ciclistas nas cidades. Não tenho uma resposta certa para explicar esse comportamento, mas acredito que tenha a ver com pensamentos egoístas instaurados pelas sociedades de consumo.

Para melhorar essa situação e fazer com que as cidades respeitem o ciclista e ofereçam condições reais de segurança para se pedalar, precisamos seguir firmes com movimentos como o Fórum. Precisamos manter um trabalho em conjunto com setores públicos, privados, com ativistas e cidadãos. Seguir convocando as pessoas e o mundo a melhorar a infraestrutura para o ciclista e educar a população a ter mais empatia é a chave para conseguir que mais gente use a bike e se sinta segura pedalando.

Você acha que um dos legados da pandemia será transformar as cidades e torná-las mais amigas da bicicleta?
Sem dúvida a pandemia tem obrigado, de certa forma, a que mais pessoas usem a bici como meio de transporte, afinal oferece menos risco de contágio que, por exemplo, o transporte público.

Quando se aumenta a demanda, é preciso ampliar a infraestrutura ciclística. E, de certa maneira, a pandemia vem ajudando a acelerar esse processo de construção de uma mobilidade sustentável, com a criação de mais quilômetros de ciclovias e outros espaços exclusivos para a bicicleta.

Espero que esse impulso continue, não apenas com mais infraestrutura dentro das cidades, mas também conectando cidades e populações próximas.

]]> 0 Cultura da bike underground perde uma de suas maiores lendas nos EUA https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2020/12/07/cultura-da-bike-underground-perde-uma-de-suas-maiores-lendas-nos-eua/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2020/12/07/cultura-da-bike-underground-perde-uma-de-suas-maiores-lendas-nos-eua/#respond Mon, 07 Dec 2020 21:56:52 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/12/monstertrack2-469-x3-1606324524-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=3000 Se a efervescência da cultura da bike se expande hoje em diversos lugares do mundo — como em São Paulo –, saiba que muito disso se deve a guerreiros do underground ciclístico que, anos e anos atrás, já davam o sangue para ocupar seu espaço em cidades violentas para quem pedala.

É gente que se juntava em manifestações como a Massa Crítica, tirava a roupa nas Pedaladas Peladas e que, mesmo sem apoio de governo ou marcas do setor, transformava o planeta em um lugar melhor, por meio da bicicleta.

Por isso o blog de hoje é dedicado a David Confer, um negro norte-americano de 52 anos que se tornou sinônimo da cultura da bike em Washington DC. Mecânico, dono de bike shop, organizador de crit races do submundo das duas rodas de sua cidade, David morreu hoje, após sofrer meses de cirrose e alguns anos depois de se recuperar de um câncer.

David à esquerda, durante um de seus formidáveis Tour de Bike Lane (Foto: The Awesome Foundation)

Esse “fixeiro” (como são chamados os ciclistas que curtem bike fixa, de uma só marcha) fez história ao participar de todos os projetos mais legais de bike de Washington e ao estar à frente de iniciativas sensacionais, como o Tour de Bike Lane DC.

Nesse Tour fantástico, David e uma galera se juntavam algumas vezes por mês ao redor de ciclovias do centro da cidade e, tal qual em eventos famosos como o Tour de France, torciam, vibravam, gritavam, davam flores e celebravam qualquer pessoa que passasse por ali de bicicleta. Sinos, assobios, música e cerveja compunham a balada, que foi criada apenas para festejar quem pedalava em Washington.

Mais uma imagem do formidável Tour de Bike Lane de David Confer (Foto: The Awesome Foundation)

David também ajudou a sofisticar o conceito de bicicletaria. Não, meu caro, uma boa bike shop não tem a ver com bikes milionárias na vitrine ou ferramentas brilhando em bancadas de aço escovado.

Uma loja de bicicleta excelente é aquela em que nos sentimos em casa, paramos para bater papo com nosso amigo — que por acaso é também o mecânico do lugar –, ficamos horas discutindo sobre o melhor guidão e de onde vamos embora com a certeza de que voltaremos em breve. E isso a Fathom Custom Bikes de David sabia fazer de forma exemplar (como, em São Paulo, também fazem, por exemplo, o Las Magrelas, a Ciclo Urbano e a oficina do mito Tom Cox).

Por sua loja modesta, passava a comunidade da bike de Washington, e cada bike criada por ele era largamente discutida com o futuro dono, em divertidos papos. Sempre sem grana, David ainda dava ótimos descontos aos fregueses, afinal, dinheiro não é o objetivo final de quem ama bicicleta de verdade.

David já bem debilitado devido a problemas no fígado (Foto: @demoncatslookbook)

Em 2017, David enfrentou um linfoma não-Hodgkin e, sem condições financeiras para bancar o tratamento em um país sem SUS, juntou grana com uma vaquinha e a ajuda de amigos. Dois anos depois, em março de 2019, ele acordou passando muito mal e logo foi diagnosticado com sérios problemas no fígado.

Alguns meses atrás, os médicos deram pouco tempo de vida a David, e outra vaquinha foi organizada pelos amigos, para que ele passasse os últimos dias com conforto em sua casa, após um ano difícil no qual ele se viu sem fontes de renda.

A comunidade ciclística de Washington se uniu, acolheu uma de suas maiores lendas e até organizou uma pedalada em sua homenagem, mesmo sem a participação de David, que ficou muito debilitado pela doença e já não conseguia fazer o que mais amava.

David morreu ao lado de sua companheira, cercado (mesmo que de longe, por causa da pandemia) por uma extensa rede de amigos eternamente gratos por toda a dedicação que ele mostrou à bicicleta.

Vá em paz, David! Que você pedale muito onde quer que esteja!

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Carta a Marina Harkot https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2020/11/11/carta-a-marina-harkot/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2020/11/11/carta-a-marina-harkot/#respond Wed, 11 Nov 2020 19:01:11 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/11/7pb2ur6yesl3rwv98vhnl12k7-320x213.jpg https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=2991 Querida Marina,

Não te conheci pessoalmente e, após saber da sua morte no último domingo (8/nov), fiquei me perguntando como teria sido sensacional ouvir você defendendo suas ideias tão certeiras e contemporâneas sobre mobilidade, gênero, bicicleta e cidades mais humanas.

Puxa, Marina, como alguém de 28 anos e em pleno caminho para conquistar um doutorado que São Paulo necessitava tanto morre assim? Queria ter te conhecido lá pelos seus 20 anos, para poder ter visto de perto a formação de suas teorias de que as cidades precisam ser para todos — e isso exclui segregar grupos em determinados espaços, aprisionar ciclistas em certos “chiqueirinhos” e manter divisões socioeconômicas que ainda nos remetem aos tempos coloniais da escravidão.

Sabe que ouvi muita gente próxima e querida perguntar por que você não estava pedalando na ciclovia ali da Sumaré, e sim na rua. Escutei até alguém falar que era muito tarde, já passava da meia-noite, para uma menina pedalar sozinha naquela escuridão.

Ainda bem que me enviaram um vídeo da sua orientadora, a professora Paula Freire Santoro (FAU-USP). Porque eu, na minha tristeza, não teria tido a clareza de proferir as palavras tão impactantes de Paula: você estava no lugar onde deveria estar. No horário em que queria estar. Conhecia aquele trecho de São Paulo muitíssimo bem. A questão não é culpar a própria vítima pelo “incidente” (termo que você mesma usou em uma palestra, pois não foi “acidente”). As cidades são para todos, né, Marina? É preciso urgentemente aprender a compartilhar os espaços.

Adeus, Marina, obrigada por tudo (Foto: Arquivo Pessoal)

Na cidade de São Paulo, são tantos e tão variados os corpos que diariamente lutam para se locomover de forma limpa, seja de bike ou a pé. Todo ciclista já tomou “fechada educativa”, recebeu xingamento do nada e teve de suportar carros passarem colados a nosso guidão. O motorista, de cara feia, grita que nosso lugar é na ciclovia. A menina sozinha leva cantada e até passada de mão em movimento. Ainda bem que você sabia que nosso lugar é onde queremos estar, Marina.

Você também sabia que ciclovia não é garantia de segurança (aquela lá do Sumaré tem tantos assaltos). Em 2018, ano em que você defendeu sua dissertação de mestrado (A bicicleta e as mulheres: mobilidade ativa, gênero e desigualdades socioterritoriais em São Paulo), por exemplo, eu pedalava na ciclovia da Pedroso de Moraes e, ao atravessar a rua em um trecho sem semáforo, quase morri ao ser atingida por um carro que não olhou se ali — um local de ciclovia! — poderia haver ciclistas. Dente quebrado, ligamento rompido, rosto cheio de hematomas e meses em trauma.

Que pena que não nos conhecíamos para você me dar força e me fazer entender que, diante da violência do trânsito, é preciso continuar, estudar, debater, lutar por um mundo melhor.

Eu, logo após ser atropelada pedalando em uma ciclovia de SP

Eu fico olhando suas fotos, seu rosto ainda tão jovem, porém já tão cheio de conquistas. Sinto orgulho imenso de sua garra, de seu talento para analisar problemas e soluções para as caóticas cidades brasileiras.

Caramba, Marina, o mundo é mesmo tão doido. Não acredito que não vai dar para te convidar para uma cerveja em alguma bicicletaria de São Paulo e te ouvir me explicar que, sim, as cidades têm futuro — e passam por políticas públicas sérias, nas quais o carro para de ser o centro dos interesses para dar lugar aos pedestres e ciclistas.

Precisava tanto do seu sorriso agora para me animar e me dar conforto na certeza de que os políticos brasileiros um dia vão entender isso.

Prometo não perder as esperanças, Marina. Tem horas que bate desânimo. Mas não seria justo com você e tudo o que você estudou em busca de um mundo melhor.

Obrigada por tudo. E um abraço apertado.

 

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10 razões para você começar a pedalar (agora!) https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2020/08/13/10-razoes-para-voce-comecar-a-pedalar-agora/ https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/2020/08/13/10-razoes-para-voce-comecar-a-pedalar-agora/#respond Thu, 13 Aug 2020 21:54:22 +0000 https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/Captura-de-Tela-2020-08-12-às-18.26.14-320x213.png https://ciclocosmo.blogfolha.uol.com.br/?p=2870 Nunca na história recente de São Paulo tivemos tantos fatores reunidos — bons e ruins — para você começar a pedalar. Ou, se você já pedala, para convencer amigos e parentes a abandonar o carro ou o transporte público e tornar a bicicleta parte da rotina.

A conjuntura propícia, infelizmente, não está sendo aproveitada como poderia por nossos governantes. Que pena: políticos de cidades como Bogotá, Lima, Paris e Berlim, entre tantas outras, perceberam o poder da bike neste mundo pandêmico e estão adotando medidas para incentivar a população a pedalar, como ciclovias emergenciais e até dinheiro para que as pessoas façam manutenção em suas bikes antigas.

Mas, mesmo sem muito apoio do poder público, podemos fazer nossa parte e ajudar a alavancar o potencial que a bicicleta tem de melhorar e transformar cidades, comunidades e indivíduos, mais ainda na era do coronavírus.

É hora de eleger e bicicleta como meio de transporte (Foto: Diego Padgurschi/Folhapress)

Pensando nisso, eis aqui uma lista com dez singelas razões para que as pessoas percebam que a vida na pandemia e depois dela trará mudanças importantes, muitas desagradáveis e algumas até que interessantes. Com esforço da sociedade civil, São Paulo ainda tem chance de experimentar os benefícios da ascensão da bicicleta entre os hábitos positivos trazidos pelo tal “novo normal” — tomara que não percamos essa oportunidade.

1. Proteção contra aglomerações

Em tempos de distanciamento social, a bicicleta se firma como um meio de transporte dos mais seguros. Mais ciclistas nas ruas significa menos gente lotando ônibus e metrô, além de menos carros poluindo e congestionando a cidade.

2. Mais dinheiro no bolso

Que pedalar faz a gente gastar menos com passagem de ônibus e metrô, Uber, estacionamento, multas, IPVA e outros impostos parece óbvio. Mas quanto, de fato, a bike ajuda a aliviar os gastos? Em 2018, um estudo inédito realizado pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), com patrocínio do banco Itaú Unibanco, revelou que o impacto em nossos bolsos seria considerável, em especial nas classes mais baixas, com uma economia de 14% na renda mensal.

3. Vários modelos de bike no mercado

Foi-se o tempo em que só havia mountain bikes pesadonas e feiosas para quem queria começar a pedalar na cidade. Hoje há modelos para cada necessidade. Dobráveis, elétricas, femininas, parrudas para carregar coisas, versáteis que se saem bem no asfalto e na terra… Gostar da própria bike é essencial, e ajuda bastante a manter o hábito de pedalar. E não esqueça: é melhor gastar um pouco mais e comprar uma bicicleta de maior qualidade, pois equipamentos melhores significam mais segurança, mais conforto e menos manutenção.

4. Sua mente agradece

“Já se sabe que pedalar não melhora apenas a saúde física, mas também tem impacto positivo na saúde mental”, disse recentemente o nigeriano Tijjani Muhammad-Bande, presidente da Assembleia Geral da ONU. Ele está certo: um estudo de 2018 publicado na revista médica inglesa Lancet mostrou que indivíduos que se exercitam têm 43% menos dias ruins, mentalmente falando, do que os sedentários. E que pedalar é a segunda atividade física que mais contribui para isso, segundo as pessoas que participaram da pesquisa. Após meses sem sair ou socializar, sentir o vento no rosto é revigorante demais.

5. Aos domingos, tem de novo a Ciclofaixa

Criado em 2009, o programa Ciclofaixa de Lazer ajudou muitos paulistanos a experimentar o prazer de pedalar sem pressa, curtindo o domingo. Só que, devido ao fim da parceria com a Bradesco Seguros, seu funcionamento foi interrompido em 2019. Para felicidade geral, no dia 19 de julho passado, a Ciclofaixa voltou, com seus 117,7 km agora sob patrocínio da Uber. O uso de máscara é obrigatório para todos, mesmo durante o exercício.

6. Conheça São Paulo de outro jeito

Seja para ir ao trabalho ou para espairecer nos finais de semana, pedalar faz com que a gente se aproprie da cidade de um jeito único. Para desviar de grandes avenidas, você precisa testar ruas menores, o que jamais faria se estivesse de carro. A velocidade da bicicleta te permite reparar em cantinhos paulistanos nunca antes vistos. O inglês Alastair Humphreys popularizou o termo micro-aventuras: ou seja, não é preciso viajar para terras distantes para se divertir ao ar livre. Pegue sua bike no final de semana, escolha uma região da cidade e gaste algumas horas explorando caminhos e lugares.

7. A Ciclovia do Rio Pinheiros melhorou

Desde março, a Ciclovia do Rio Pinheiros está sob administração da iniciativa privada, a Farah Service. Além de reparos e manutenção, a empresa instalou ali uma pracinha com café e cadeiras, e pretende lançar em breve uma série de projetos para atrair mais paulistanos. Será instalado sistema de iluminação e o local ficará aberto até tarde (hoje fecha às 18h). Com 21 km em sua totalidade (hoje apenas parcialmente abertos para ciclistas), a ciclovia é um lugar especial, que faz com que as pessoas redescubram o leito do rio e pedalem longe do estresse do trânsito.

8. Um baita treino para cicloviagens

No novo normal, por um bom tempo vamos viajar menos para lugares distantes, precisaremos evitar deslocamentos longos em ônibus cheio de gente e estaremos bem sem grana para gastar em passagens (ainda mais com o dólar nas alturas). Viajar de bike é divertidíssimo e barato. Mas requer prática e experiência — que podem ser adquiridas nos pedais diários pela cidade.

9. Opção para quem não quer academia

Falta de grana ou medo do coronavírus têm sido fatores a brecar o retorno de muita gente para as academias. Poucos exercícios aeróbicos são tão eficientes para o condicionamento que pedalar. Tire uns dias da semana para usar a bike como treinamento físico (não esqueça de sempre levar algo para comer).

10. Teremos novas ciclovias

Em julho, a capital ganhou novas ciclovias, na avenida Henrique Schaumann e na Avenida Brasil. Esses novos trechos se interligam a outros que levam ao Parque do Ibirapuera. São parte do Plano Cicloviário da São Paulo, no qual a prefeitura se comprometeu a implantar, até dezembro deste ano, 173 km de novas ciclovias (além de 310 km de reformas e melhorias em trechos já existentes).

 

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