Colírio na pandemia: as fotos maravilhosas do mais antigo clube de cicloturismo off-road
Se a pandemia tem nos proibido de pedalar (pelo menos entre os ciclistas sensatos), ainda podemos sonhar com estradas e trilhas desafiadoras e cicloviagens por montanhas longínquas, em aventuras nas quais só importa o prazer libertário que a bike é capaz de proporcionar.
Que o digam os integrantes do Rough-Stuff Fellowship, o mais antigo clube de ciclismo off-road do planeta. Criada em 1955, em Leominster, uma pequena cidade do Reino Unido, quase divisa com País de Gales, a organização possui um dos mais belos e comoventes arquivos de fotos de expedições ciclísticas, desde aquela época até hoje.
São imagens como estas que você aqui no Ciclocosmo, tiradas por viajantes que há mais de seis décadas perceberam dois pontos essenciais para uma vida feliz: conhecer o mundo em cima de uma bicicleta e, de preferência, por estradas sem pavimentação que cortam terras isoladas e paisagens únicas.
O Rough-Stuff Fellowship surgiu quando Bill Paul, um ciclista de Liverpool, decidiu colocar um anúncio na então revista The Bicycle, conclamando entusiastas de cicloviagens off-road para se unir a ele em um clube. Poucos meses depois, cerca de 40 pessoas se reuniam em um pub em Leominster para o primeiro encontro da organização — que, aliás, funciona até hoje.
Não se tratava de um clube para ultraciclistas que pedalam milhares de quilômetros, muito menos uma instituição para celebrar recordes ou grandes performances atléticas. Era, isso, sim, uma reunião de pessoas comuns, em sua maioria de classe média, com uma enorme paixão por desbravar a Terra de bike. Sem distinção de sexo, como você pode checar nas diversas imagens de mulheres participando das trips.
Pelas fotos (como a de cima), dá para ver como boa parte das expedições era um “empurra-bike” sem fim. Os dois ciclistas que foram pedalando de Katmandu, capital do Nepal, até o campo base do Everest, em 1984, confessaram que pedalaram uns 20% do percurso, empurrando suas bicicletas quase 80% do trajeto restante. Pura aventura da maior qualidade.
Uns dois anos atrás, o clube contratou o arquivista Mark Hudson para cuidar das milhares de imagens que foram sendo colecionadas ao longo das décadas, muitas delas de qualidade surpreendente. Os retratados se mostram cheios de estilo, com suas bikes de ferro de guidão curvo, encarando perrengues sensacionais.
Hudson não só organizou o arquivo como criou uma conta do Rough-Stuff Fellowship no Instagram, o que tem ajudado o clube a ganhar notoriedade e atraído aficionados por viagens desse tipo, em especial após a popularização da modalidade gravel (não sabe o que é? Escrevi sobre isso aqui).
Eram tantas fotos maravilhosas que Hudson decidiu que havia material suficiente para um livro, lançado recentemente no Reino Unido (mais informações aqui).
Conversei com Mark Hudson para saber mais sobre esse fantástico clube que, com suas fotos, nos faz lembrar do poder que é ganhar o mundo pedalando (mesmo que tenhamos de esperar em casa até o arrefecimento de uma pandemia).
Quantas fotos possui o arquivo do Rough-Stuff Fellowship? Você tem uma preferida?
MARK HUDSON Há mais de 20.000 imagens, até perdi a conta exata! Uma grande parte é de slides em 35 mm, mas temos também muitas fotos e negativos em preto e branco. Não consigo ter uma imagem preferida, porque há tantas muito boas! E cada uma é envolta em sua história.
Como o arquivo foi se expandindo ao longo das décadas? Ainda há gente que envia fotos?
Tem crescido muito! Eu continuo encontrando fotos antigas que não conhecia, e também estou sempre aberto a receber mais material. Antes de eu me tornar arquivista do Rough-Stuff Fellowship, havia apenas umas 200 imagens disponíveis. Agora temos milhares, além de uma ótima coleção do nosso periódico Rough-Stuff Fellowship, cuja origem data de 1955. E também diários e recortes de jornais e outros tipos de materiais dos membros do clube.
A conta de Instagram do clube surgiu em 2018 e já conta com 18.000 seguidores. O que essas fotos têm que vêm atraindo tanta gente?
Quando eu comecei no arquivo, quis imediatamente compartilhá-lo com pessoas que não faziam parte do clube. A resposta foi incrível. Eu acho que isso aconteceu porque as pessoas das fotos são gente comum que se jogou por aí com suas bikes décadas e décadas atrás. É o tipo de pedal (ou caminhada!) que muitos ciclistas estão fazendo só agora. Espero que os seguidores do nosso perfil se sintam inspirados a viajar e curtir a natureza.