Proteja a vida do ciclista (e ainda ganhe dinheiro com isso)
Antes de começar a ler este texto, vá lá no Google Notícias e digite: “Ciclista morto”. Você verá algo como este tétrico print screen:
Infelizmente o mês de outubro não está sendo atípico em relação a acidentes envolvendo ciclistas e seu maior inimigo: o veículo motorizado. Tivemos casos que foram de maior destaque em jornais e redes sociais, em especial o da fotógrafa Valda Nogueira, que morreu atropelada no Rio de Janeiro na madrugada do dia 3.
Um talento da fotografia nacional, Valda foi atingida por um ônibus quando passava de bicicleta na Avenida Heitor Beltrão, na Tijuca.
Mas não foi somente Valda que perdeu a vida neste país que valoriza o carro, enquanto despreza a bicicleta e onde os raros esforços governamentais de incentivo ao uso da bike como transporte parecem que estão sendo cada vez mais abandonados. Como já escrevi neste espaço, 2019 não está sendo fácil para quem pedala.
Se Valda recebeu (certa) atenção da imprensa e usuários de redes sociais, o mesmo não se deu com outras vítimas.
No dia 2 de outubro, “um ciclista” morreu ao ser atropelado por um caminhão caçamba em Recife. Não sabemos seu nome, nem idade, e a notícia saiu em poucos jornais locais. Isso sem contar as mortes que nem em jornal local foram parar, muito menos os acidentes que não resultaram em vítimas, mas levaram uma longa lista de ciclistas para o hospital.
E nem vamos debater aqui as “fechadas educativas” que tomamos diariamente de motoristas mal educados, que jogam o carro em cima mesmo — frequentemente acompanhado de gritos enfurecidos como “vai para a ciclovia!”.
Não há luz no fim do túnel ou soluções a curto prazo que não envolvam uma mudança na forma como governantes e cidadãos olham não apenas para a questão da segurança dos ciclistas, mas especialmente para a óbvia constatação de que incentivar o uso da bicicleta é incentivar cidades melhores e com mais qualidade de vida.
Porém algumas empresas já perceberam que esse “filão” pode ser lucrativo (falta apenas essa mentalidade também chegar com mais força ao Brasil). Neste mês, por exemplo, a Apple anunciou que começou a vender em suas lojas físicas e online o capacete Lumos Matrix, que traz um sistema customizado de luz traseira que pode sinalizar para onde o ciclista pretende seguir, como setas de um carro (veja o capacete no vídeo abaixo):
O capacete não é novo, porém sua produção e venda vão certamente estourar com a parceria com a gigante da tecnologia. E a iniciativa da Apple comprova que há um mercado enorme a ser explorado no universo do uso da bike na cidade — e o melhor, isso pode render lucro e fomentar a indústria.
Outro peso-pesado dos negócios que tem aos poucos virado os olhos para a comunidade ciclística é, quem diria, a Uber.
Nos últimos tempos, a empresa vem financiando projetos como o Bike Arte Gira, um festival itinerante que estimula a ocupação das ruas por pessoas e suas bikes, em vez de carros, além de pedaladas (curtas, diga-se) em algumas cidades do país.
No dia 27 de setembro, sem muito alarde, a Uber também lançou um novo recurso em seu aplicativo para, segundo a empresa, “incentivar práticas que aumentam a segurança dos ciclistas nas ruas”. Se o usuário termina sua viagem em região próxima a ciclovia, verá um aviso para que tome cuidado ao abrir a porta, para não atingir nenhum ciclista em movimento.
A iniciativa começou a funcionar primeiramente em São Paulo e no Rio de Janeiro, e está em fase de testes.
A Uber não está gastando grana com ciclistas à toa. A marca já tem seu próprio sistema de bikes elétricas compartilhadas, batizado de JUMP (nome da empresa adquirida pelo aplicativo).
No ano passado, ela anunciou que o serviço estaria disponível no Brasil em 2019, porém isso não aconteceu ainda. Mas, nos Estados Unidos, até já foi divulgado que, em 2020, a Uber instalará quiosques de troca de bateria em diversas cidades para alimentar as e-bikes (e também scooters e patinetes).
Vamos repetir de novo aqui, até que todo mundo compreenda bem: bicicleta melhora cidades e é o centro de uma infinidade de negócios e projetos que podem dar muito lucro. E, o mais importante, podem proteger a vida do ciclista.
Centros urbanos com mais bikes são mais seguros em todos os sentidos, mais saudáveis e, claro, mais felizes.