Documentário mostra o amor de duas mountain bikers e seu estilo de vida libertador
Nos últimos anos, têm sido produzidos muitos documentários curtos de ação dedicados a diversas modalidades da bicicleta, em especial o mountain bike.
Poucos, no entanto, conseguiram mesclar cenas de aventura a temas tão atuais quanto defesa dos direitos LGBT, empoderamento feminino, liberdade e respeito mútuo quanto “Life of Pie” — que será exibido em um telão enorme, no domingo (18/ago), no Parque Villa-Lobos, como parte da programação do Festival de Filmes Outdoor Rocky Spirit.
Lançado em julho deste ano, o mini-doc de pouco menos de 12 minutos é uma declaração original de amor ao mountain bike, esporte que uniu as norte-americanas Anne Keller e Jen Zeuner, e uma ode ao direito de sermos quem quisermos, do jeito que quisermos.
Em 2002, o casal se mudou para Fruita, no Colorado, uma das cidades mais conservadoras desse estado norte-americano. Em mente estavam objetivos claros: fugir de lugares com custo de vida altíssimo, explorar algumas das trilhas de bike mais sensacionais do país, levar uma vida mais tranquila e com mais tempo para pedalar (clarooo!) e abrir uma pizzaria que pudesse reunir boa comida e almas de vanguarda como elas. Awesome!
Dirigido por Ben Knight and Travis Rummel, o filme revela a personalidade libertária das duas ciclistas. Porém vai além: a conservadora Fruita foi aprendendo a aceitar as diferenças e incluindo o casal na comunidade — mesmo que algumas pessoas ainda não frequentem a pizzaria por ser de propriedade de duas lésbicas.
“No começo, nossa sensação com o filme foi: ‘Ah, nossa vidas não são lá uma grande coisa assim’. Porém esse posicionamento teve de ser substituído por uma compreensão sobre algo maior: de que é incrivelmente importante para qualquer minoria ser representada de forma precisa e autêntica em universos dos quais não faz parte – especialmente nos dias de hoje”, diz Zeuner (leia entrevista com ela abaixo).
Os funcionários gente finíssima do Hot Tomato Cafe dão depoimentos emocionados sobre como trabalhar ali tem ajudado a moldar sua perspectiva de mundo, em um país cada vez mais tacanho (pelo menos, politicamente).
Entremeando depoimentos e cenas do cotidiano, estão tomadas belíssimas das duas curtindo as trilhas do Colorado. Aos 50 anos, Jen prova (ainda precisamos provar!) que mulheres mais “velhas” arrasam, sim, no esporte, no mountain bike, nos direitos humanos. O amor e respeito entre as duas é outro abraço que o filme dá no espectador.
A seguir, um bate papo com Jen Zuner sobre “Life of Pie”, diversidade e liberdade.
Como foi o processo de protagonizar um filme que não trata apenas de bike, mas da vida de vocês duas. Houve algum receio de se expor para o público?
JEN ZEUNER O processo todo aconteceu de forma muito fluída. Nós não estávamos tentando ser outras pessoas. E confiamos muito em Ben e Travis, que se tornaram nossos amigos ao longo dos anos. Sabíamos que estaríamos em boas mãos. Houve algumas conversas antes, porém a principal forma como trabalham é ir desenvolvendo a narrativa conforme filmam, sem muitas instruções ou direção.
Para ser sincera, achei que o filme seria muito mais sobre a Hot Tomate e a cidade de Fruita. Então vimos um primeiro corte do filme. Não que a gente tenha ficado exatamente nervosas, mas foi preciso recalcular em nossas mentes sobre o que de fato seria o documentário. Sempre fomos muito abertas sobre quem somos, entretanto foi necessário um trabalho interior mesmo para a gente perceber que o filme estava sendo feito em um momento importante para o avanço da diversidade na comunidade outdoor. Ou seja: não poderíamos estar apenas “ok” com o filme falando da nossa história; seria preciso se posicionar como ativistas.
Como a bike tem ajudado vocês duas a conquistar espaço em uma sociedade que nem sempre aceita bem as escolhas individuais?
Nós duas somos absurdamente apaixonadas por bicicletas e toda a experiência que trazem. Quando nos mudamos para Fruita, contactamos primeiramente pessoas da comunidade da bike para novas amizades e também para nos dar um senso de pertencimento.
Isso nos ajudou muito a evitar que nos sentíssemos outsiders. Esporte e recreação podem ajudar pequenas cidades a crescer de maneira positiva, e consequentemente melhorar a comunidade para todos que nela vivem.
E o que vocês mais curtem em mountain bike?
Amamos o tanto de alegria que nos dá o simples ato de pegar a bike, ir para o outdoor e curtir o silêncio. Aprecio isso bastante nos dias atuais, com todas as distrações de hoje. Pegar a bike e explorar uma trilha me acalma, ao mesmo tempo que desafia os meus limites – e ainda posso me encher de pizza e cerveja se me sentir culpada!