Audiência pública convoca a todos para debater bloqueio da Tradicional Descida de Santos
Continuamos todos nós, ciclistas e simpatizantes, ainda passados com o fim polêmico da “Tradicional Descida a Santos” deste ano. Relembrando os fatos: no último dia 10 de dezembro, cerca de 3.000 ciclistas (segundo a Polícia Militar) foram impedidos de continuar o passeio que larga da capital até a praia — e que acontece há anos e já entrou para nosso calendário de eventos ciclísticos. Isso se deu por causa de uma de decisão da Justiça, que levou a PM a montar um bloqueio na altura do km 40 da rodovia Anchieta, que vai ao litoral. Segundo noticiou esta mesma Folha de S.Paulo, o juiz Celso Lourenço Morgado, da Vara de São Bernardo do Campo, cismou que o passeio ameaçaria a circulação de veículos no sistema Anchieta/Imigrantes.
Resultado: milhares de ciclistas, entre eles muitas famílias, tiveram de dar meia-volta. O encontro, um dos maiores do Brasil, é independente, geralmente organizado via redes sociais — e uma de suas razões é, exatamente, mostrar ao poder público que nós, ciclistas, merecemos respeito e espaço digno.
Mas se engana quem acha que o episódio surreal ficará “por isso mesmo”. Amanha (dia 20), a partir das 18h, acontece na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo a audiência pública “Repressão ao uso da bicicleta no sistema Anchieta-Imigrantes”. “Por meio de requerimento elaborado pelo mandato do deputado Alencar Santana Braga, a Ciclocidade [Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo] convoca todos e todas para ouvir, discutir e cobrar o poder público e a empresa concessionária do sistema Anchieta-Imigrantes sobre os ocorridos”, diz Aline Cavalcante, cicloativista da Ciclocidade.
Pela sociedade civil, estarão na mesa da audiência William Cruz, do Vá de Bike, e Carla Moraes, do Bike Zonal Sul, que farão o relato dos acontecimentos no dia do passeio. Haverá ainda a presença de Renata Falzoni, que contará o histórico da Rota Marcia Prado e dos deslocamentos pelo sistema Anchieta/Imigrantes, e Rene Jose Rodrigues Fernandes, da Ciclocidade, que falará dos principais marcos legais sobre o uso da bicicleta em estradas.
A seguir, Aline fala um pouco mais sobre o tema da audiência e sobre o atual e bizarro contexto em que estamos vivendo, em que pedalar parece estar cada vez mais difícil em São Paulo:
CICLOCOSMO: Qual a importância de uma audiência pública como esta, no contexto atual que vivemos em São Paulo, de cerceamento como o ocorrido na Tradicional Descida de Santos?
Tanto a Ciclocidade quanto outras organizações, coletivos, movimentos sociais e imprensa já fizeram algum tipo de contato para tentar abrir o diálogo com o Governo do Estado e com a Ecovias, pois sabemos que as rodovias são importantes nos deslocamentos de bicicleta. Infelizmente, em sua maioria, são hostis aos ciclistas – tanto ao cicloturista quanto ao atleta e ao trabalhador. Nunca tivemos espaço para essa aproximação. Ambos os órgãos negligenciam completamente a existência e os direitos dos ciclistas. A audiência pública é, mais uma vez, uma tentativa de diálogo utilizando um espaço importante, a Assembléia Legislativa. Queremos pressionar e qualificar o debate e tentar que, de alguma forma, possamos ser vistos pelo poder público estatual — e respeitados, como manda a lei.
Qual a posição da Ciclocidade sobre o que ocorreu na Descida de Santos?
A Ciclocidade repudia categoricamente o que aconteceu na descida para Santos, tanto do ponto de vista da decisão equivocada do judiciário, que desrespeitou direitos fundamentais, quanto da violência descabida da polícia, da falta de diálogo da Ecovias e da negligência histórica do Governo do Estado. A violência é institucionalizada e se manifesta de diversas formas. Além da audiência pública, estamos em contato com advogados, analisando medidas institucionais a serem tomadas sobre o caso. Precisamos da presença massiva dos ciclistas, de todos os grupos e tipos, commuters, atletas, cicloviajantes, trabalhadores, entusiastas. Todos! É muito importante essa pressão para mostrar que existimos e que exigimos respeito à vida.
Como você, em particular, avalia todos esses revezes que andam acontecendo em São Paulo em relação a quem pedala, como as ações do prefeito João Doria para dificultar a implementação de ciclovias e até estreitar outras já existentes?
É muito triste assistir a tanto retrocesso acontecendo em São Paulo, mesmo quando todo o debate internacional indica o caminho inverso. A gestão Doria está na contramão do desenvolvimento urbano humano e sustentável, dificultando o diálogo com os cidadãos e burocratizando medidas que deveriam ser simples. As maiores cidades do planeta estão abrindo cada vez mais espaço para os ciclistas e pedestres, ouvindo as pessoas, melhorando o transporte de massa, desacelerando as ruas e requalificando o espaço público. Agora, mais do que nunca, precisamos nos unir e voltar a pressionar o poder público, ocupando os espaços políticos e de participação social. Não podemos aceitar! Por isso convido a todos(as) leitores deste blog que se manifestem publicamente, que pressionem os políticos, participem de pedais e protestos e fortaleçam as associações de ciclistas de sua região. Todas as formas de pressão são importantes neste momento.
A seguir veja como foi o bloqueio, em vídeo feito por Caio Caciporé: