Campanha alerta motoristas: abram a porta do carro com a outra mão, caramba!
Tudo aconteceu tão rápido que eu, a princípio, não entendi por que, raios, estava jogada no meio da rua, com minha bike com guidão entortado do lado. Por um triz, um carro que vinha logo atrás não passou por cima de mim. Era sábado de manhã, na rua Mourato Coelho, no bairro de Pinheiros (SP). Após quase 15 anos pedalando, eu enfim havia sido vítima de um dos acidentes mais comuns — e perigosos — para quem anda de bike em cidades: ser atingido do nada pela porta de um veículo estacionado, que se abre sem qualquer aviso.
Foi mais ou menos isso que me aconteceu, neste vídeo feito por um ciclista de Nova York:
Foi a partir de um acidente parecido, porém fatal, que o médico norte-americano Michael Charney decidiu arregaçar as mangas e tomar um atitude. Inspirado nas leis holandesas, ele criou o The Dutch Reach Project, uma iniciativa para divulgar e conscientizar motoristas do mundo todo a saírem do carro à la Holanda: com a mão que está mais distante da porta. Isso obriga quem está dentro do veículo a rotacionar o corpo e, assim, olhar para trás. Esse gesto absurdamente simples permite que a pessoa veja se uma bike está vindo.
O artigo 49 do Código Brasileiro de Trânsito diz: “O condutor e os passageiros não deverão abrir a porta do veículo, deixá-la aberta ou descer do veículo sem antes se certificarem de que isso não constitui perigo para eles e para outros usuários da via”. Porém não faz nenhuma recomendação sobre como a porta deve ser aberta.
Para impactar políticas públicas e popularizar a prática que é lei na Holanda, Charney criou um site, banner, vídeos, hashtags e outras ideias para espalhar o gesto mundo afora. A seguir, ele fala mais sobre o tema:
Quais os principais objetivos quando você pensou no The Dutch Reach Project?
A ideia do projeto sempre foi influenciar diretamente o responsável por esse tipo de acidente: o motorista. É ele quem abre a porta, é ele quem deve mudar de atitude. E a beleza da simplicidade da “pegada holandesa” é a tentativa de mudar um comportamento besta por outro tão besta quanto, porém que pode salvar muitas vidas – basta a pessoa abrir a porta com a outra mão!
Outras campanhas de proteção ao ciclista são mais vagas, no sentido de que pregam coisas como “atenção às bikes” ou “olhe no espelho retrovisor para ver se não há uma bicicleta vindo”. O The Dutch Reach Project quer apenas alterar uma memória corporal; no momento em que a pessoa internaliza o movimento, pronto, muitas vidas já estão automaticamente protegidas.
Qual a dificuldade em fazer a campanha?
Não é fácil fazer com as pessoas de fato pratiquem abrir a porta com a outra mão. Isso leva tempo, e é preciso ajuda externa, como campanhas governamentais com adesivos, placas, divulgação em redes sociais. Mas a vantagem é que se trata de um gesto muito simples e direto, e que deveria ser lei em todos os lugares. Uma frase como “Vire e olhe” já resolve a questão e faz muita gente pensar.
Como outras pessoas podem ajudar a divulgar?
Você está fazendo isso agora, por exemplo! Da minha parte, faço campanha pelo telefone, falando com as pessoas, dando entrevistas, postando no Twitter, no Instagram, divulgando hashtags. De forma independente, outras pessoas podem fazer o mesmo, atuando com estratégias semelhantes. Assim vamos conquistando mais ciclistas, cada vez mais motoristas, e organicamente esse gesto banal vai se popularizando.
As pessoas aí do Brasil podem traduzir o “Dutch Reach” como quiserem, ou adotar hashtags como #dutchreach ou #doorzone. Podem fazer seus próprios cartazes e adesivos. Ter material que graficamente explique o que é o Dutch Reach ajuda sempre. Escrevam sobre isso, peguem o material que quiserem do meu site, descubram sua própria forma de espalhar o assunto e ampliar o debate. Salvem vidas!