Microfinanciamento de bikes transforma milhares de vidas em Uganda

Erika Sallum

A ideia não poderia ser mais simples, e por isso mesmo genial: por meio de um projeto de microfinanciamento, uma organização sem fins lucrativos tem ajudado milhares de pessoas nas áreas rurais de Uganda a comprar uma bicicleta. As bikes novas vêm transformando profundamente a vida de pequenas comunidades do país da África oriental: a bordo de sua magrela, esses ugandenses chegam mais rápido a mercados para vender seus produtos agrícolas, podem se consultar em melhores postos de saúde e buscar água limpa bem mais rapidamente (e sem ter de carregar pesados galões na cabeça). Isso sem contar os jovens e as crianças, que agora levam menos tempo para ir de casa à escola.

Equipe da Bicycles Against Poverty monta as bikes do projeto, em Uganda (Foto: Divulgação/BAP)

Criada em 2009 por Muyambi Muyambi, um então estudante ugandense aluno da Universidade de Bucknell, na Pensilvânia (EUA), a Bicycles Against Poverty trabalha oferecendo microcrédito para a compra de bicicletas. O “cliente” tem um ano para pagar, em várias prestações. Recebe uma bike novinha, que custa em torno de US$ 85 (parte desse valor pode ser bancado pela própria organização, dependendo do caso).

A ONG começou tímida, com apenas duas pessoas. Nos últimos anos, expandiu-se e atualmente conta com 12 funcionários. Até hoje já financiou 2.300 bicicletas, em mais de 40 comunidades rurais da nação de passado sanguinolento, protagonizado por ditadores como Idi Amim Dada. Essas bikes acabam quase sempre sendo compartilhadas com o resto do vilarejo — a ONG calcula que, assim, seu projeto já impactou cerca de 11.000 pessoas, em uma região do continente africano onde mais de 80% das famílias não possuem condições financeiras de comprar uma bicicleta.

Ugandense com sua bike nova, comprada por microfinanciamento da ONG (Foto: Reprodução/GoPro)

A norte-americana Molly Burke é cofundadora e diretora-executiva da Bicycles Against Poverty e explica a seguir um pouco mais sobre a organização:

Por que uma bicicleta se torna uma ferramenta tão importante para melhorar a vida das pessoas em Uganda?
Uma simples bicicleta permite que um pequeno agricultor carregue cinco vezes mais produtos para o mercado mais próximo do que se estivesse a pé. É capaz de levá-lo a distância quatro vezes maiores – para alcançar melhores mercados, melhores postos de saúde e melhores oportunidades de vida. Temos visto a presença desses agricultores em mercados triplicar após a aquisição de uma bike. Isso vem levando a um crescimento de 35% na renda dessas pessoas, algo colossal para a população rural de Uganda. Mais de um terço do público com os qual trabalhamos começam um novo negócio em um período de um ano após pegar uma bike – e cerca de 80% usam suas bicicletas para tocar o novo empreendimento. Uma bicicleta significa um aumento de quase 40% no acesso a postos de saúde.

Por que vocês optaram pelo modelo do microfinanciamento? Como isso ajuda a empoderar as pessoas de Uganda?
Nós trabalhamos com indivíduos que não têm condições de pagar uma bike de uma só vez (ou seja, a maioria dos lares da África oriental). Nós damos a elas a chance de pagar a dívida em várias parcelas, durante o período de um ano. Nossa organização permite assim que essas pessoas tenham acesso a um meio de transporte que elas podem pagar, e que realmente pode mudar suas vidas – aliviando os problemas de se morar em lugares isoladíssimos do país. Cada bike que financiamos impacta a vida de cinco pessoas, pois quase sempre é usada de forma compartilhada pela família e pela comunidade. Elas se orgulham muito de suas bicicletas e sabem que deram duro para pagá-las, parcela por parcela, durante o ano inteiro.

Comunidade de Uganda durante evento da ONG (Foto: Foto: Divulgação/BAP)

Quais são os maiores desafios até agora?
Sem dúvida um de nossos maiores desafios tem sido conseguir contemplar mais pessoas com o microfinanciamento da bike. Mas isso não é possível. Temos critérios para eleger quem se qualifica para conseguir o empréstimo, para garantir um microfinanciamento responsável e consciente.

Outro desafio também tem sido nosso próprio crescimento como organização: passamos de uma para duas pessoas, até chegar a um time de 12 funcionários. Há muitos desafios que surgem quando se cresce assim, mas sempre tudo vale a pena.

E quais são as maiores conquistas da organização nestes anos?
Dos tempos de faculdade até agora, nós já promovemos o financiamento de 2.300 bicicletas, em mais de 40 comunidades. Impactamos até agora a vida de cerca de 11.000 ugandenses, ajudando milhares de famílias como a de Muyambi a ter acesso a um meio de transporte transformador. A maior recompensa tem sido ver mães fazerem um financiamento de bike e pagarem tudo direitinho. Essas mulheres são a força motriz de seus vilarejos, trabalhando dia e noite para cuidar dos filhos e netos. Em Uganda, são elas que realizam a maior parte do trabalho – não apenas os afazeres domésticos, mas também no campo. São elas que trazem dinheiro para casa. Mas geralmente não têm a chance de possuir algum bem. A Bicycles  Against Poverty trabalha junto a elas para que essa situação mude e para que tenham mais oportunidades.

Assista a uma reportagem da CGTN Africa sobre a Bicycles Against Poverty: