A montanha mais terrível do ciclismo ganha ‘biografia’ de Jeremy Whittle

De todos os percursos mais temidos do ciclismo, sem dúvida os desafios do Tour de France — que neste ano começa dia 1° de julho — estão entre os mais duros. E, na história do Tour, poucas montanhas são tão aterrorizantes quanto o Mont Ventoux, na Provence, sul da França. Nem sempre o monte, de 1.912 metros, faz parte da competição (em 2017, por exemplo, estará de fora). Porém, toda vez que os ciclistas precisam escalá-lo, sabem que enfrentarão um dos maiores sofrimentos da história do esporte. A notoriedade do “Gigante da Provence”, conhecido pelos franceses como “a montanha matadora”, é tanta que neste mês ela ganha uma primorosa “biografia”. “Ventoux: Sacrifice and Suffering on the Giant of Provence” é a mais recente obra do jornalista Jeremy Whittle, que escreve há 20 anos sobre ciclismo para o The Times. Publicado pela Simon & Schuster, o livro conta alguns dos “causos” mais dramáticos que já se passaram ao longo daquelas curvas e subidas íngremes assoladas por ventos brutais, que totalizam uma escalada de 21.5 km de martírio a partir da clássica rota Bédoin (há outras duas formas de se chegar ao topo, mas esta é a mais famosa no ciclismo).

Foi tentando conquistar o Ventoux que o britânico Tom Simpson perdeu a vida, aos 29 anos, no Tour de France de 1967. Primeiro ciclista de seu país a vestir a camisa amarela de líder da prova, ele colapsou perto do cume, morrendo dentro do helicóptero que o resgatou, devido a uma explosiva mistura de calor, álcool e anfetamina. Diz a lenda que, ao passar mal na montanha, Tom, totalmente delirante, teria dito: “Coloque-me em cima da bike de novo”. Vinha se sentindo mal do estômago dias antes, mas, pressionado por sua equipe, resolveu continuar, à base de bebidas e estimulantes. Um memorial foi erguido em sua homenagem, e todo ciclista que se atreve a tentar alcançar o cume do Ventoux faz uma parada para celebrar o atleta.

O britânico Tom Simpson colapsa no Ventoux, no Tour 1967 (Foto: Domínio público)

Alguns anos depois, o mito belga Eddy Merckx daria shows de ciclismo escalando o Ventoux. A montanha também foi palco de uma impressionante batalha entre o americano Lance Armstrong e a lenda italiana Marco “Pirata” Pantani, em 2000. Os dois, que depois teriam suas carreiras marcadas por escândalos de doping, lutaram ombro a ombro até o topo, com Pantani vencendo a etapa, e Lance conquistando o título do Tour daquele ano. Pantani morreria apenas quatro anos depois, em meio a abusos de cocaína e outras drogas.

A lenda belga Eddy Merckx pedalando no Ventoux (Foto: Reprodução)

Até no ano passado o Ventoux virou o centro de uma das etapas mais eletrizantes do Tour de France. Após um acidente causado por uma moto, o britânico Chris Froome, que venceu a competição em 2016, saiu da bike e correu a pé, de sapatilha e tudo, cercado por uma multidão de fãs. Naquele mesmo dia, os organizadores da prova já haviam anunciado que a etapa 12 seria encurtada em 6 km, para evitar os ventos de mais de 100 km/h que atacavam o cume do Ventoux.

O “Gigante da Provence” guarda lendas inesquecíveis de um dos esportes mais emocionantes do mundo. O livro de Whittle chega numa boa hora de relembrar alguns desses momentos marcantes. Leitura obrigatória para quem ama ciclismo, tradição e muito drama.

Capa do novo livro de Jeremy Whittle, expert em ciclismo